Se algum dia duvidamos do poder de uma trend no TikTok, essa dúvida já não existe mais. A tendência apelidada de #quittok se tornou uma prática recorrente dos usuários da rede social, em sua maioria jovens, que filmam suas demissões, sendo elas voluntarias ou não.
Longe dos métodos tradicionais de comunicação de uma saída do emprego, essa nova abordagem se destaca pela espontaneidade de registrar e compartilhar publicamente o fim de uma experiência profissional.
Com mais de 40 milhões de visualizações, a hashtag #quittok é mais um reflexo de como os jovens encaram o trabalho atualmente e o impacto dessa mudança nas dinâmicas da relação empregador-empregado no mundo real e virtual.
Descubra agora o que é essa trend e o que os especialistas têm a dizer sobre os possíveis impactos do quittok no mercado de trabalho!
O que é o #quittok?
Ao fazer uma busca simples na internet, nos deparamos com milhares de vídeos de demissão em diversos formatos. Há gravações secretas de funcionários em uma videochamada ao vivo, enviando carta de demissão por e-mail para o seu chefe tóxico e até mesmo registros em que o colaborador é dispensado pela empresa sem maiores explicações.
Como tudo na internet, é difícil saber quem foram os criadores da hashtag #quittok, mas a trend não é tão nova como estamos inclinados a imaginar.
Um dos primeiros vídeos virais que ganhou a atenção da mídia foi publicado pela norte-americana Marisa Jo em 2020. Ela compartilhou no TikTok suas reações antes e depois de pedir a saída do emprego. A postagem original acumulou mais de 213 mil curtidas e 2302 compartilhamentos.
@itsmarisajo It’s like an elephant took its foot off my chest, but I’m also sad. Onward & upward ?? #quittingcorporate #quittingmyjob #HelloWinter #9to5problems ? Dog Days Are Over – Florence & The Machine
Outro vídeo viral: em julho de 2021, funcionários do McDonald’s se demitem no meio do expediente no Reino Unido. O momento foi gravado e ganhou milhares de visualizações.
Mais recentemente, no início de 2024, tivemos o caso da norte-americana Brittany Pietsch. A jovem gravou secretamente a reunião online em que é demitida da empresa CloudFare.
A evidente falta de preparação dos funcionários que conduziram o momento comoveu a internet a tal ponto que o CEO da empresa, Matthew Prince, se manifestou no X, admitindo que “o erro foi não sermos mais gentis e humanos”.
O Brasil não escapou à onda do quittok. Exemplo disso é a postagem de Alana Vetroni que ganhou mais de 6 milhões de visualização. A designer gráfica acreditava que seria promovida, mas quando percebe que um representante do setor de Recursos Humanos (RH) da empresa está na videochamada, entende que a demissão viria.
A justificativa apresentada pelos interlocutores no vídeo é a falta de fit cultural com a marca empregadora. Segundo Alana, ela se recusou a compartilhar com os demais funcionários da empresa os materiais didáticos, que havia preparado para um projeto social, sem ser recompensada.
Vale lembrar que a popularidade da hashtag #quittok está sendo, de certa forma, alimentada por outras tendências que também se originaram na rede social.
Trends do TikTok estão afetando como os jovens se estabelecem no mercado de trabalho.Fonte: Getty Images
O que dizem os especialistas
Os jovens da geração Z (nascidos entre 1995 e 2010) são os protagonistas da maioria dos vídeos #quittok. O que nos leva a entender qual é a motivação para compartilhar esse tipo de conteúdo que, culturalmente, era visto como assunto privado e (quase) proibido de ser comentado.
Para Késia Simeão, supervisora de RH em uma empresa no segmento de Saúde e Tecnologia, é importante ter em mente que a geração Z são os nativos digitais. Ou seja, são indivíduos que cresceram com as redes sociais como ferramentas para expor sentimentos e partilhar instantaneamente suas vivências para encontrar sua comunidade.
Exatamente pela relevância que a carreira profissional tem em nossas vidas, é natural que o momento da demissão se torne um tópico comum de debate em plataformas como TikTok, Instagram e X.
“As empresas têm um papel na sociedade que vai além dos fins produtivos, também envolve os aspectos emocionais e sociais dos indivíduos“, reforça Simeão.
Além disso, trends como o quittok vem pressionando mudanças nas organizações empregadoras – principalmente quem foi denunciada por práticas que prejudicam o bem-estar e saúde mental do trabalhador.
Por outro lado, engana-se quem pensa que a internet não tem memória. O que você diz online pode te seguir no mundo físico e atrapalhar futuras oportunidades de trabalho, dependendo de como se refere ao emprego anterior.
“É preciso proteger sua marca pessoal”, afirma a coach de carreira Corinne Mills para a NationalWorld. O processo seletivo de uma empresa pode não se limitar ao estudo do currículo e entrevista do candidato.
Os recrutadores podem conferir o que está relacionado ao nome do profissional na web e desconfiar da capacidade do candidato de não divulgar dados corporativos confidenciais.
Por fim, há as possíveis consequências legais. Se o vídeo publicado possibilita a identificação da empresa ou dos demais envolvidos no processo de demissão, o responsável pela postagem pode ser processado e, segundo a advogada Ana Cristina Valentim, acarretar demissão por justa causa.
Como o mercado de trabalho pode lidar com a nova geração?
A ascensão do quittok também pode ser vista como um reflexo da pandemia do COVID-19. O questionamento “viver para trabalhar ou trabalhar para viver” incentivou muitos trabalhadores a reavaliarem o que desejam para suas carreiras.
Esse cenário se torna ainda mais complexo quando profissionais de gerações tão diferentes ocupam o mercado de trabalho. “As empresas não estão sabendo canalizar essa energia da geração Z em prol da organização”, diz Simeão.
A especialista explica que é danoso culpabilizar os jovens pela imaturidade profissional e emocional. “O RH deve estar acompanhar a experiência do colaborador dentro da empresa, enquanto os gestores precisam garantir que haja comunicação transparente e o cumprimento de protocolos éticos”, afirma Simeão.
Apesar de serem polêmicas por tratar de assuntos tão sensíveis como a demissão em vídeos de poucos segundos, parece que as trends têm o real poder de provocar mudanças nos valores e comportamentos compartilhados pelos membros de uma organização – a tão falada “cultura organizacional” da empresa!
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