A Nvidia confirmou ontem (21) sua “lua de mel” com os bons resultados financeiros e revelou que no último trimestre do ano passado teve receita de US$ 22,1 bilhões (cerca de R$ 108 bilhões na cotação atual). O balanço surpreendeu os analistas e representou um aumento incrível de 265% na comparação com o número do mesmo período de 2022.
Em 2023, a empresa famosa pela fabricação da linha GeForce de GPUs conseguiu ainda uma receita líquida de US$ 60,9 bilhões (R$ 300 bilhões), alta de 126% na comparação com 2022.
E um dos destaques do balanço financeiro da Nvidia foi o setor de data centers. Eles tiveram um crescimento de 409% em receita na comparação entre 2022 e 2023.
Os resultados financeiros da Nvidia de 2023 surpreenderam os analistas (Imagem: JHVEPhoto/Getty Images)
Arthur Igreja, especialista em tecnologia e inovação, diz ao TecMundo que o resultado expressivo dos data centers é explicado pelas aplicações de inteligência artificial (IA). Soluções de IA demandam muito poder de processamento e máquinas muito mais poderosas do que temos em casa.
“As IAs estão começando a fazer coisas absolutamente espetaculares, mas elas não são baratas e demandam muita infraestrutura. Existe uma discussão no mundo da tecnologia de que se a IA consegue substituir um ser humano em determinada tarefa. Sim [consegue substituir os humanos], mas no presente o custo é enorme e, bem provável, que a pessoa seja mais barata”, pontua.
Como uma empresa de GPUs vale mais que Google e Amazon?
Os executivos da Nvidia estão obviamente satisfeitos com os resultados da empresa. Além dos lucros bilionários, a marca também alcançou a casa do trilhão. Na primeira quinzena deste mês de fevereiro, as ações da empresa de GPUs chegaram ao valor de US$ 1,825 trilhão (R$ 9 trilhões).
Sem contexto, o número não tem muito significado. Contudo, para se ter uma ideia, o valor ultrapassou o da Alphabet (holding dona do Google), que era de US$ 1,821 trilhão (R$ 8,9 trilhões), e Amazon, que valia US$ 1,7 trilhão no período (R$ 8,4 trilhão).Com isso, a Nvidia ficou (pelo menos temporariamente) na terceira colocação dentre as empresas mais valiosas dos Estados Unidos, atrás somente de Apple (segunda) e Microsoft (primeira).
Os fatos suscitam a dúvida de como um negócio conhecido pelas placas de vídeo acaba valendo mais que o principal buscador do planeta e a gigante do comércio eletrônico e dona da Alexa. E a palavra que indica a resposta já foi citada no texto.
A Nvidia se consolidou como uma empresa do grupo do trilhão (Imagem: Justin Sullivan/Getty Images)
“O que o mercado e as bolsas valorizam dependem muito do que é a onda do momento. E a onda do momento é a inteligência artificial. Como os investimentos em IA são massivos, a priorização que os investimentos atraem são empresas que empregam ou desenvolvem IA. Por consequência, tudo isso acaba desaguando na Nvidia de alguma forma”, pontua Arthur Igreja.
Jensen Huang, fundador e CEO da NVIDIA, reconheceu que principalmente a IA generativa atingiu o “ponto da virada”. “A demanda está aumentando em todo o mundo em empresas, indústrias e nações”, afirmou o executivo no balanço divulgado ontem.
Nvidia é muito mais que uma empresa gamer
Como se vê, a Nvidia não é um empreendimento exclusivamente gamer, por mais que jogadores a reconheçam por isso. No momento, a empresa de Santa Clara, na Califórnia, é uma companhia de inteligência artificial.
“O mercado de jogos historicamente tem sido fundamental para o crescimento da Nvidia, devido à necessidade de GPUs produzidas para o processamento de gráficos. Mas a maior parte do crescimento observado no último ano e início de 2024 é proveniente da necessidade das GPUs para desenvolvimento e processamento de IA e LLMs [Grandes Modelos de Linguagem]”, argumenta Paulo Gitz, estrategista global da XP, em entrevista ao TecMundo.
Arthur Igreja acrescenta que a marca já vem conseguindo “surfar” muito bem várias ondas da tecnologia há algum tempo. Ele lembra que a corporação começou com as placas de vídeo e foi adaptando os produtos após chegar à liderança no setor.
A placa de vídeo GeForce RTX 4090 chega a custar mais de R$ 20 mil dependendo da edição (Imagem: Adnan Ahmad Ali/Getty Images)
Lá em 2008, por exemplo, começou a aumentar a demanda de mineração de criptomoedas por causa da invenção do bitcoin. E lá estavam as GPUs da Nvidia sendo usadas pelos mineradores. Nos últimos anos, temos visto o florescimento da IA e as peças da Nvidia que fazem renderização de imagens, vídeos e processam quantidades inimagináveis de dados seguem com bastante demanda.
“Só que no topo disso tudo, ao invés de simplesmente fabricar hardware, a Nvidia tem criado uma série de soluções também no âmbito do software. Ou seja, ela também começou a ter uma receita expressiva de software como serviço”, diz o especialista em inovação e tecnologia.
Até onde a Nvidia pode chegar?
Com centenas (ou milhares) de soluções utilizando IA, uma dúvida que fica é: até onde a Nvidia pode chegar? Ela pode alcançar o posto de empresa mais valiosa do mundo? Arthur Igreja afirma que não é impossível, mas que um longo caminho precisaria ser trilhado.
Para começar, há o desafio financeiro, já que Apple e Microsoft estão avaliadas em US$ 2,8 trilhões (R$ 13 trilhões) e US$ 3,05 trilhões (R$ 15 trilhões), respectivamente. Além disso, as big techs colossais são mais consolidadas (ambas foram fundadas na década de 70, enquanto a Nvidia é de 1993) e estão ancoradas mais em entregas de resultados no presente do que projeções para o futuro.
“O mercado gosta de fazer essas apostas. Se ela [Nvidia] pode se tornar [a empresa mais valiosa do mundo]? Sim. Agora, dada a dimensão de tudo que Microsoft e Apple fazem, seria um pouco estranho no curto prazo. A Nvidia teria que expandir sua área de atuação, criar uma liderança muito expressiva em inteligência artificial que fosse muito além das GPUs”, defende.
Em março, a Nvidia realizará o GTC, conferência para desenvolvedores (Imagem: Justin Sullivan/Getty Images)
Outro ponto nesse debate todo é sobre como os clientes poderiam ser recompensados por este crescimento exponencial. Apesar de controlar parte importante do setor de placas de vídeos, a Nvidia não conseguiria fazer um “milagre” para baratear sozinha as peças, por exemplo.
Na verdade, a queda nos preços das GPUs dependeria ainda de diversas medidas a longo prazo, incluindo o aumento da oferta e popularização das peças de computador.
“Isso, entretanto, não deve acontecer tão cedo, à medida que as companhias seguem investindo em aumento da capacidade produtiva e as encomendas seguem acelerando”, finaliza o estrategista global da XP.